segunda-feira, 23 de junho de 2008

Como esquecer?

Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa – como é que se faz quando a pessoa que se precisa já não está lá?

As pessoas têm de morrer, os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar. Sim, mas como se faz? Como se esquece?

Devagar. É preciso esquecer-se devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer as maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas!

É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguém antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso primeiro aceitar.

É preciso aceitar esta mágoa, esta moínha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados, se tivessem apenas o peso que têm em si; isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução.

Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padece. Muitas vezes só existe a agulha.

Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado.

O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar.

Porque é nos momentos em que estamos mais cansados ou mais felizes que sentimos mais a falta das pessoas que amamos? O cansaço faz-nos precisar delas. Quando estamos assim, mais ninguém consegue tomar conta de nós. O cansaço é uma coisa que só o amor compreende. A minha mãe. O meu Amor. E a felicidade. A felicidade faz-nos sentir pena e culpa de não podermos partilhar. É por estarmos de uma forma ou de outra sozinhos que a saudade é maior.

Mas o mais difícil de aceitar é que há lembranças e amores que necessitam do afastamento para poderem continuar. Afonso Lopes Vieira dizia que Portugal estava tão mal que era preciso exilar-se para poder continuar a amar a pátria dele. Deixar de vê-la para ter vontade de a ver. Às vezes a presença do objecto amado provoca a interrupção do amor. É complicado o curto-circuito, o encurralamento, a contradição que está ali presente, ali, na cara do coração, impedindo-o de continuar.

As pessoas nunca deviam de morrer, nem deixar de se amar, nem separar-se, nem esquecer-se, mas morrem e deixam-se e separam-se e esquecem-se. Custa aceitar que os mais velhos, que nos deram vida, tenham de dar a vida para poderem continuar vivos dentro de nós. Mas é preciso aceitar. É preciso aceitar. É preciso sofrer, dar urros, murros na mesa, não perceber. E aceitar. Se as pessoas amadas fossem imortais perderíamos o coração. Perderíamos a religiosidade, a paciência, a humanidade até.

Há uma presença interior, uma continuação em nós de quem desapareceu, que se ressente do confronto com a presença exterior. É por isso que nunca se deve voltar a um sítio onde se tenha sido feliz. Todas as cidades se tornam realmente feias, fisicamente piores à medida que se enraízam e alindam na memória que guardamos delas no coração. Regressar é fazer mal ao que se guardou.

Uma saudade cuida-se. Nos casos mais tristes separa-se da pessoa que a causou. Continuar com ela, ou apenas vê-la pode desfazer e destruir a beleza do sentimento, as pessoas que se amam mas não se dão bem só conseguem amar-se quando não se dão.

Mas como esquecer? Como acabar com aquela dor? É preciso paciência. É preciso sofrer. É preciso aguentar.

Há grandeza no sentimento. Sofrer é respeitar o tamanho que teve um amor. No meio do remoinho de erros que nos revolve as entranhas, da raiva, do ressentimento, do rancor – temos de encontrar a raiz daquela paixão, a razão original daquele amor.

As pessoas morrem, magoam-se, separam-se, abandonam-se, fazem os maiores disparates com a maior das facilidades. Para esquecê-las, é preciso chorá-las primeiro. Esta é uma verdade tão antiga que espanta reparar em como ainda temos esperanças de contorná-la. Nos uivos das mulheres nas praias da Nazaré não há "histerias" nem "ignorância" nem "fingimento". Há a verdade que nós os modernos, os tranquilizados, os cools, os cobardes, os armados em livres e independentes, os tanto-me-fazes, os anestesiados, temos medo de enfrentar.

Para esquecer uma pessoa não há vias rápidas, não há suplentes, não há calmantes, ilhas nas Caraíbas, livros de poesia – só há lembranças, dor e lentidão, com uns breves intervalos pelo meio para retomar o fôlego.

Esta dor tem de ser aguentada e bem sofrida com paciência e fortaleza. Ir a correr para debaixo das saias de quem for é uma reacção natural, mas não serve de nada e faz pouco de nós próprios. A mágoa é um estado natural. Tem o seu tempo e o seu estilo. Tem até uma estranha beleza. Nós somos feitos para aguentar com ela.

Podemos arranjar as maneiras que quisermos de odiar quem amamos, de nos vingarmos delas, de nos pormos a milhas, de lhe pormos os cornos, de lhe compormos redondilhas, mas tudo isto não tem mal. Nem faz bem nenhum. Tudo isto conta como lembrança, tudo isto conta como uma saudade contrariada, enraivecida, embaraçada por ter sido apanhada na via pública, como um bicho preto e feio, um parasita de coração, uma peste inexterminável, barata esperneante: uma saudade de pernas para o ar.

O que é preciso é igualar a intensidade do amor a quem se ama e a quem se perdeu. Para esquecer, é preciso dar algo em troca. Os grandes esquecimentos saem sempre caros. É preciso dar tempo, dar dor, dar com a cabeça nas paredes, dar sangue, dar um pedacinho de carne (eu quero do lombo, mesmo por cima da tua anca de menina, se faz favor).

E mesmo assim, mesmo magoando, mesmo sofrendo, mesmo conseguindo guardar na alma o que os braços já não conseguem agarrar, mesmo esperando, mesmo aguentando como um homem, mesmo passando os dias vestido de preto, aos soluços, dobrado sobre a areia da Nazaré, mesmo com muita paciência e muita má vontade, mesmo assim é possível que não se consiga esquecer nem um bocadinho.

Quanto mais fácil amar e lembrar alguém – uma mãe, um filho, um grande amor – mais fácil deixar de amá-lo e esquecê-lo. Raio de sorte ó lindeza, miséria suprema do amor. Pode esquecer-se quem nos vem à lembrança, aqueles de quem nos lembramos de vez em quando, com dor ou alegria, tanto faz, com tempo e com paciência, aqueles que amámos com paciência, aqueles que amámos sinceramente, que partiram e nos deixaram, vazios de mãos e cheios de saudades.

E quando alguém está sempre presente? Quando é tarde. Quando já não se aguenta mais. Quando já é tarde para voltar a trás, percebe-se que há esquecimentos tão caros que nunca se podem pagar. Como é que se pode esquecer o que só se consegue lembrar? Aí, está o sofrimento maior de todos. O luto verdadeiro. Aí está a maior das felicidades.


(O texto é do MEC)


Retirado de um flog.

domingo, 22 de junho de 2008

O nada no poder.


Eu poderia conquistar mil terras junto aos reis. Poderia sobreviver mil guerras. Poderia cantar mil vezes à mesma canção. Poderia contar mais mil segundos ajoelhado. Eu poderia ser mais que o meu próprio ser. Eu poderia conquistar mil anos, mas conquista mais difícil é a do seu coração.
Eu poderia medir o mundo com uma linha Eu poderia dominar os mares, mas não poderei dominar seus pensamentos. Eu poderia fazer mil promessas a mil pessoas e quebrá-las, mas jamais conseguiria quebrá-las se fossem feitas pra você.Eu poderia sobreviver ao dilúvio, aos tornados... Eu poderia sobreviver a mil enchentes, mas eu jamais sobreviveria à enchente dos seus beijos. Eu poderia ter mil corações aos meus pés, mas jamais terei o seu. Eu poderia estar em dois lugares ao mesmo tempo, mas minha alma, meu corpo, eu peço pra estar em apenas um lugar... Do seu lado. Minha ambição aumenta quando vejo seu olhar. Minha mão estremece quando vejo seu sorriso. Tudo em você me alucina e me hipnotiza. É perfeita a forma como o vento te toca e eu o invejo. Olhar que fascina e me deixa sem direção. Perco o norte e o sul. Você é o oásis no deserto. E agora minhas orações se transformam em súplicas. Desejo de ter, querer. Anseio insaciável.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

1Co 13.8-10

Quem ama é paciente e bondoso.
Quem ama não é ciumento, nem orgulhoso, nem vaidoso.
Quem ama não fica alegre quando alguém faz uma coisa errada, mas se alegra quando alguém faz o que é certo.
Quem ama NUNCA desiste, porém suporta tudo com fé, esperaça e paciência.

domingo, 8 de junho de 2008

Musicalidade

O poder da musicalidade de me descrever me fascina e me completa. As várias sensações que ela ajuda a descrever do melhor jeito possível, com seus instrumentos e voz. Diz exatamente o que eu não tenho coragem de dizer. Diz o que eu tenho medo de dizer e então quando eu canto é como se eu estivesse dizendo.

A música me embala todos os dias no mesmo conjunto de vários pensamentos sobre uma única coisa. É como se os arranjos sonoros fossem por mágica transformar todos os meus desejos em realidade. Como se tudo fosse deixar de ser esboço de uma felicidade, pra ser realmente felicidade.

Eu não ia falar muito, mas a vontade não está sendo fácil de controlar. E eu já tenho controlado muitas vontades por aí.

Sabe quando você está dirigindo, é fim de noite e você não tem vontade de correr, só de ir dirigindo e dirigindo ouvindo o som e deixar seus pensamentos irem longe e mais longe. Tem horas que você respira fundo, tem horas que você ri sozinho, tem horas que você sente vontade chorar, tem horas que você conversa consigo mesmo, tem horas que vem uma vontade louca de fazer tudo que você sempre acha que não deve fazer. Mas você está dentro do carro e quando você sai dele tudo passa a ser segredo, mais uma vez.

Eu nem sei quantas vezes deitei na cama e cantei com toda minha alma. Mas essas vezes começaram a ser incontáveis há alguns meses. Tentando, na maioria das vezes, arrancar o que está cravado no peito. Mas parece que quanto mais eu tento, mas longe de conseguir tirar eu fico.

É esse o motivo das minhas arritmias, da minha inquietação e do meu sossego . Eu respiro, ando e vivo por isso sem querer. É como se fosse a minha única opção.

E então o CD volta ao começo. E certas coisas ainda não saíram da minha cabeça.

terça-feira, 3 de junho de 2008

Eu te amo Calado

Não existiria som se não houvesse o silêncio
Não haveria luz se não fosse a escuridão
A vida é mesmo assim
Dia e noite, não e sim

Cada voz que canta o amor não diz tudo o que quer dizer
Tudo que cala fala mais alto ao coração
Silenciosamente
Eu te falo com paixão

Eu te amo calado
Como quem ouve uma sinfonia
De silêncio e de luz
Nós somos medo e desejo
Somos feitos de silêncio e som
Tem certas coisas que eu não sei dizer

A vida é mesmo assim
Dia e noite, não e sim

Eu te amo calado
Como quem ouve uma sinfonia
De silêncio e de luz
Nós somos medo e desejo
Somos feitos de silêncio e som
Tem certas coisas que eu não sei dizer
(E digo)


Lulu Santos



Porque eu gosto de música. Eu tenho tido momentos criativos, mas eu nunca tenho um papel pra anotar porque eu tó em pé no ônibus lotado indo pro cursinho. E então eu começo a pensar em outras n coisas e esqueço do texto que bolei. Mas as férias estão chegando e eu vou poder postar minhas tentativas poéticas.